Wednesday 19 December 2007

Friday 7 December 2007

À maneira do Stieglitz

Qatsi - (hopi) n. vida


Koyaanisqatsi é o primeiro filme da trilogia qatsi de Godfrey Reggio. Trata-se de um documentário que opõe o ambiente natural ao ambiente criado pelo Homem, vivendo somente de imagens e banda sonora.

Desprezando um enredo tradicional, o filme desresponsabiliza-se em relação ao tema e apresenta apenas as imagens criando comparações, deixando o espectador tirar as suas conclusões. No entanto, a forma como essas imagens são exploradas de modo a criar comparações mais explícitas conduz logicamente o espectador e passa uma mensagem subtil. O uso da câmara lenta e da aceleração da imagem obrigam-nos a concentrar nas imagens e analisá-las, descobrindo assim as analogias e ironias sobre o nosso próprio ambiente. Como exemplo, recordo no início do filme a montagem feita com imagens aceleradas de nuvens e em câmara lenta de ondas do mar, evidenciando um padrão semelhante na sua forma e movimento; saliento igualmente uma montagem com os mesmos recursos que contrapunha, com uma atitude mais crítica, o enchimento de salsichas numa fábrica à passagem de pessoas numa série de escadas rolantes.

A série de imagens que desfilam ao longo de 86 minutos, recolhidas entre 1975 e 1982, combinadas com a banda sonora de Philip Glass, mostram, na minha opinião, o resultado das alterações que a humanidade fez ao seu ambiente, de tal maneira que deixamos de viver na Natureza, de onde viemos, e a forma como nos servimos dela para sustentar este ambiente artificial. Koyaanisqatsi é uma palavra da língua índia Hopi, como é esclarecido no final do filme, e significa “vida em desequilíbrio” («life out of balance; crazy life; life in turmoil; life disintegrating; a state of life that calls for another way of living»). É muito interessante a forma como esta ideia é dada ao longo do filme, por vezes criando uma diferença de ritmos que conduzem as emoções e a leitura do espectador, como por exemplo uma montagem acelerada da vida urbana com um ritmo de exaltação e triunfo (pelas cores, aceleração e música) que pode ser lido como sarcástico quando comparado com o momento em que a exaltação termina abruptamente (com uma mudança radical de escala de plano, ritmo da imagem e da música) e se segue um distanciamento que impõe uma reflexão crua. Esta ideia de koyaanisqatsi está, a meu ver, perfeitamente ilustrada na penúltima cena, na qual se segue o lançamento de um foguetão - a sua longa ascenção, cativante, a sua súbita explosão, chocante, e a sua lenta queda, consternadora.

Numa perspectiva técnica, penso que este é um excelente filme para estudar a força dos planos e enquadramentos, das imagens e formas, e principalmente das velocidades e escalas e do efeito que estes factores têm sobre o espectador. Concluindo, parece-me um exercício muito pertinente, relativamente ao momento em que vivemos, e realizado de uma forma creativa e eficaz.